impressões cotidianas

Imagine um documentário que recebe a colaboração de trinta diretores simultaneamente, em tempo real e aberto ao público. É mais ou menos isso que já vem acontecendo em São Paulo e outras grandes cidades do mundo. No caso da capital paulista, vários motoboys receberam celulares com câmera para mostrarem suas impressões cotidianas: durante o dia eles fotografam e filmam acontecimentos de quase todas as naturezas e fazem o upload na internet pelo próprio celular.

Esta iniciativa é apenas um exemplo do emprego de uma câmera de bolso que lhe permita filmar ou fotografar a qualquer momento. Já existem videoblogs e festivas de filmes feitos apenas com essas camerazinhas. E o que é mais interessante é que devido principalmente às restrições dos aparelhos em termos de formatos, cores, qualidade e tamanho, esses vídeos já nascem com estética própria e uma linguagem diferente do cinema.

Em dezembro de 2008 o Coletivo Centopéia promoveu o seminário Câmera Cotidiana, com oficinas, debates e apresentação de trabalhos feitos com essas novas possibilidades, ou devo dizer mídias? Achei interessante o tema e também a oficina da qual participei. E apesar de ter aprovado o fato dos vídeos terem sua própria identidade, me parece que já foram criadas regras demais para a produção.
camera cotidiana

Entres as características desses vídeos estão, por exemplo, os planos mais fechados. Partindo do pressuposto de que a resolução do vídeo é baixa, quanto mais elementos você tentar colocar no enquadramento, mais perderá em qualidade. Também há limitação de cores, o que requer um aumento no contraste. E a característica mais marcante é que eles geralmente são curtos. O festival arte.mov aceita vídeos que tenham entre vinte segundos e três minutos de duração, que em se tratando de celulares já é considerado um longa-metragem.

Tudo isso já é realidade e de fato é bem interessante, porque a cada evolução tecnológica aumentam as possibilidades de produção audiovisual. Porém, como sempre, surgem algumas dúvidas e considerações sobre as câmeras de bolso prontas para agir em qualquer hora.

A estética e os formatos comuns desses filmes realizados com celular surgiram principalmente pelas limitações técnicas do equipamento. Os próprios vídeos em loop infinito são tão rápidos que é necessário vê-los várias vezes para entender todas as suas imagens. Mas o que irá acontecer com este estilo quando o celular, esse aparelho que cada vez engloba mais funções como um canivete suíço do século XXI, for capaz de produzir imagens em alta definição?

Talvez seus realizadores tenham que se adequar mais à linguagem cinematográfica, ou o cinema a eles. O fato é que isso pode permitir mais uma grande mudança no cinema, tanto na forma de se pensar, quanto na forma de se produzir. O cinema feito por celulares até hoje, se parece com o primeiro cinema de atrações feito no final do século XIX e início do século XX, poucos cenários, planos contínuos, acontecimentos casuais, limitações técnicas, mas é difícil pensar que sua evolução seguirá o mesmo curso. Na verdade é impossível prever o resultado dessas mudanças que já estão em andamento.

O que é possível prever é que a “síndrome de Big Brother” vai crescer cada vez mais. De repente cada pessoa tem a possibilidade de ser um “vigilante”, tudo pode estar sendo gravado, mesmo naquela conversa de fila de banheiro. Mas como toda mudança traz boas e más notícias, esperemos que seja possível usufruir com inteligência estas novas possibilidades. Certo é que todos terão de se acostumar com a exposição que poderão sofrer a qualquer momento e em qualquer lugar.

Renato Prado
renato@nonanuvem.com.br

assista ao vídeo “o assalto” realizado por Renato, Nancy, Aline e Coelho durante o seminário
camera cotidiana

outras palavras:
nacho durán – videoblog

fernando velázquez – blogart

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Uma resposta a impressões cotidianas

  1. Joelma Paes disse:

    Oi Renato,
    Obrigada pelo post. A idéia é que o Seminário aconteça mais vezes, inclusive pra que possamos entender e participar do que está acontecendo.
    Abraços

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